quarta-feira, 2 de outubro de 2013

ESTE PORTO NÃO É O NOSSO PORTO...

A cidade do Porto nunca foi uma cidade de grandes mudanças e de grandes transformações. As suas elites sempre estabeleceram uma espécie de compromisso entre um Porto Conservador e Burguês, e um Porto Socialista e Republicano. A sociedade portuense nunca foi dada a grandes rupturas sociais, culturais e políticas. Pelo contrário, as grandes mudanças foram-no sempre em nome de Revoluções e de mudanças violentas em contextos muito especificos.

As suas instituições tiveram sempre aquele ímpeto transformista, mas nunca foram uma força de mudança radical. O Porto sempre foi uma cidade de compromissos, de pactos, de cedências, de resistências. O Porto é uma cidade de resistência, e nunca uma cidade aberta ao mundo, cosmopolita e universal. O Porto sempre teve aquele ar caseiro da Foz e da Ribeira, contracenando com os palacetes da rica burguesia. 

Uma cidade que vai da «Ribeira até à Foz» na voz de Rui Veloso, e, que traduz bem este lado rural, fechado, localista e tripeiro.

O Porto nunca foi de Garrett e de herculano ou de Antero. Nem mesmo o foi de Eugénio de Andrade. Mal o poeta fechou os olhos e encerram-lhe a fundação lá para os lados da Foz. Agustina vive enclausurada na sua domus literária. O Porto é assim, fechado, elitista, burguês e provinciano. O Porto é escuro, cinzento e popular para Resende.

Os seus arquitectos são mal compreendidos e violentamente atacados na praça, no quiosque, na esquina, e agora nas redes sociais. Siza Vieira mal amado e incompreendido pela sua cidade. Souto Moura o estranho e provocador genial que desenha um burgo na vertical lá para os lados da Av. da Boavista. 

No Porto a filosofia rima com poesia. Desde Almeida e Antero, Leonardo Coimbra e Pascoaes, Teófilo e Pedro Homem de Mello. No Porto nunca houve aquilo que poderiamos chamar de Escola. A escola era o café, a tertulia, o gabinete, o sindicato, a viagem, a Cooperativa Árvore e a Confronto, o devaneio associados ao impulso criador - a curiosidade pelo saber e pela singularidade do outro diferente.

Nesta cidade a liberdade rima com criatividade. Ainda, hoje, falar de Escola de Arquitectura do Porto, é para os nossos arquitectos, como Siza e Souto Moura um puro eufemismo e vaidade.

Este Porto com sabor a tripas, com cheiro a rio e mar é único e singular na morfologia da cidade e na produção artística e cultural.
Mas também é um Porto mesquinho, estreito e redutor quando olha para os seus criadores e génios com desconfiança e desdém, próprios de um pequeno burgo que vive com um pé na Foz e outro na Metrópole. O Porto de Manuel de Oliveira é universal e cinematográficamente genial quando retrata o quotidiano de um Porto pobre e clandestino e faz daí a sua arte.

O Porto político tem sido um Porto do aparelho e da clientela. Pouco lucido e universal. Tem faltado raça e engenho ao governo da cidade. Vereadores que se recusam a atribuir ruas a poetas e a escritores; que negam a arte e a cultura que faz «ser» a sua cidade. 

O Porto Político é conservador e mesquinho, egoísta e analfabeto. Burguês na acção e rude no pensamento. O Porto Político desconfia da universalidade e da sua identidade cultural. Persegue e desloca os fracos que habitam na cidade, e protege e glorifica os fortes que vivem à sombra dos poderes que governam a cidade. 

Hoje!... Sim, hoje, gostavamos de ter um novo Porto. Um Porto que dialoga-se com os fortes e portege-se os fracos. Que fizesse da sua governança uma lição de cultura civica aberta ao mundo, à criatividade e à diferença cultural. 

Um Porto que tivesse como propósito a criação e valorização de uma cidade para todos e com todos. Um espaço inclusivo alicerçado em valores humanistas de respeito pelas diferenças singulares. 

Uma cidade onde as ruas não podem ser unicamente um espaço de negócio mas um lugar de convivio, de fraternidade e de socialização. Onde o viver aqui seja um ato digno de respeito por todos. Um Porto que conserve e valorize as suas ruas, os seus bairros, as suas ilhas, os seus jardins.

Um Porto que abra as portas dos seus museus, das suas salas de cinema, dos seus jardins e palácios. Um Porto de espaço aberto e plural para o saber e para a arte, que se aprende a fazer nas escolas e instituições (Teatros e Cooperativas) da cidade.

Um Porto Cidade que não seja mais um Porto da não-cidade. Onde se derrubem casas e bairros, se desloquem pessoas e familias, se lance o estigma sobre comunidades inteiras. 

Este Porto não é o nosso Porto.

Não quero mais um Porto que afasta vizinhos e parentes, que deixa velhos e crianças sem cama e sem bens, sem alma e sem auto-estima.

Não quero um Porto de fato cinzento e gravata, nem a falar com sotaque de metropole. 

Quero um Porto tripeiro e popular, criativo e universal. 
Um Porto de pensamento e de acção governativa em busca da qualidade e da universalidade. 

Um Porto com propósito e com Futuro. 
Sem nunca esquecer a sua cultura e a sua identidade.

  

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