quarta-feira, 9 de maio de 2012

O Renascimento do Espaço Rural É Possível?



Falar sobre renascimento do espaço rural em pleno contexto de crise financeira e económica pode parecer à primeira vista um absurdo, mas não é de todo. As crises sempre foram momentos de viragem, de avanços, de transformações radicais com consequências na vida das pessoas, das comunidades e dos estados. Momentos para pensar e para agir.

Portugal encontra-se com um espaço rural em perda sistemática de bens, de pessoas, de massa critica, de valor social e cultural acrescentado; paralelamente temos um espaço rural com infra-estrutuas, equipamentos públicos, com acessibilidades modernas, com dimensão macroeconómica, mas que se encontram sem aproveitamento em termos de escala e de eficiência.

Os territórios pulverizaram-se quer em termos de equipamentos e infra-estruturas, perante uma população dispersa e envelhecida por um tecido urbano degenerativo, potenciador de muitos e complexos problemas urbanos e sociais.

A sustentabilidade ecológica deste espaço rural está presa por um fio. Não existe uma política de fixação da população jovem no espaço rural, capaz de introduzir massa critica e socialmente mais desenvolvida do que os "nativos" e residentes. O espaço rural é sem duvida um espaço sem inteligência mecânica, sem pensamento critico, sem uma estrutura social e económica amiga do ambiente e do desenvolvimento sustentável.

As populações que vivem neste espaço rural são grupos sociais desprovidos de conhecimento, de arte, de criatividade e de engenharia ambiental, o que levanta problemas ao desenvolvimento deste espaço rural em função de uma actividade turística de excelência no nicho turístico do ambiente e natureza. Capaz de promover boas práticas económicas amigas do ambiente e da qualidade paisagística.

As aldeias estão ainda mergulhadas numa espécie de idade média contemporânea, onde a violência doméstica, o alcoolismo, o analfabetismo, o novo riquismo, a intriga e a inveja fazem escola desde a casa à tasca, desde o terreiro da igreja ao café local. A ausência de uma cultura civica de participação e de cooperação entre vizinhos é sem duvida um dos graves problemas, e um dos factores da falta de dinâmica social e económica. O individualismo é uma regra entre vizinhos e uma doença com forte raio de contaminação social.

Instalou-se uma cultura da mediocridade, da intriga e da ignorância. Um grande obstáculo à aprendizagem nas escolas e a principal justificação de tão elevadas taxas de abandono escolar e de insucesso nas Escolas Locais.

A conflitualidade entre Escola e Comunidade é um jogo diário entre os meninos e os senhores professores que representam a cultura da inteligencia e do saber critico. A matemática e o português são um problema constante na trajectória escolar dos meninos que nascem e vivem neste contexto anacrónico cultural e civilizacional. Meninos a quem nunca se ensinou boas práticas de civilidade, de socialização moderna. A etiqueta e a conduta são uma miragem num mundo onde desde pequeno se aprende a bater, a insultar, a agredir o outro. Uma luta sem igualdade e sem honra, onde o mais forte bate e o mais fraco leva.

A familia aqui é uma metáfora ao serviço do trabalho infantil e de uma cultura de contaminação que atira os jovens para fora de casa a partir dos 16 aos 20 anos de idade. As meninas e os meninos quase nunca têm infância e aprendem desde muito cedo a linguagem do campo, da tasca, da rua e da vida. São produto de uma vizinhança agressiva e policial. Recebem o nome na pia baptismal e carregam desde muito cedo com as alcunhas que lhes marcam na pele a origem e o estatuto social; ou neste caso a sua ausência: assim, o Vinagre, o Rato, o Pulga, o Raça, o Merda Seca transportam consigo toda a violência do estereotipo da exclusão social.
São homens e mulheres de tamanho pequeno que descobrem a sexualidade cedo, sem romance  e sem fantasia. Não existe tempo para romances e contos de fadas. A vida é muito cruel para estas crianças que desde cedo são fustigadas, violentadas, agredidas e sem pudor vivem dia a dia num mundo de machos e de femeas asselvejadas pela dureza da vida. 

Um Mundo onde não existe norma, regra, hábito e autoridade. Ninguém obedece a ninguém. Os putos falam como doutores na tasca e na rua. Discutem futebol com paixão. Jogam às cartas no pátio em frente à tasca e batem-nas com força no tampo da mesa. Enquanto homens de corpos toscos e grossos, franginos e esguios emburricam canecos de vinho da terra acompanhados com cebola partida e sal.

Um espaço rural a necessitar urgentemente de uma renovação social, cultural e económica. Amigo do ambiente e das culturas ecológicas. Capaz de valorizar os patrimónios locais e de promover a sua diversidade biológica e natural. Que implemente economias energéticas amigas da sustentabilidade e do ambiente.

Que promova práticas de ordenamento territorial e florestal locais, em prol de uma floresta tradicional e de uma agricultura biológica. Aposte num turismo de qualidade, de pequena escala, de nichos de excelência na área do ambiente e da natureza. Que promova o cooperativismo e as economias sociais entre todos os proprietários agricolas e florestais. Que desenvolva foruns de estudo e de formação de quadros locais que promovam o desenvolvimento sustentável.

A concepção estratégica deste modelo de desenvolvimento do espaço rural passa pela introdução de capital humano, tecnologia adaptada aos  novos contextos geo-económicos e tecnológicos, assentes num desenvolvimento que se quer sustentável. A estratégia de renovação do espaço rural deve assentar numa estratégia que também assente na valorização territorial, no respectivo ordenamento que tenha como eixos principais a preservação e valorização ambientais e a qualiade de vida urbana e social dos seus residentes.