Os tempos que vivemos não são fáceis nem são para fazer de conta. Perante as
dificuldades que o país atravessa é sem duvida necessário uma atitude criativa,
inteligente, responsável e critica. De forma a compreender as dificuldades e a
pensar soluções eficientes e sustentáveis.
Bem aproposito esta nossa análise sobre o difícil momento que passa a
CESAP/ESAP Porto e Guimarães. Parece-nos constatar que existe uma espécie de
fechamento burocrático na instituição que impede a possibilidade de implementar
medidas, programas e estratégias para resolver este problema de financiamento e
de falta de liquidez para assumir responsabilidades futuras.
É nossa opinião que a situação não é alheia ao contexto de crise económica e
social que o país atravessa, mas também não podemos ignorar que a CESAP e as
suas Escolas (Porto e Guimarães) nada ou muito pouco fizeram para ultrapassar
os obstáculos que vão aparecendo. Se alguns dos problemas são conjunturais,
outros são muito mais graves, porque estão associados a problemas estruturais
que a instituição nunca resolveu, porque não encontrou as soluções ideais ou
porque a agenda interna era mais do domínio dos interesses de grupos, que sendo
efémeros se transformaram numa espécie de estrangulamento ao seu
desenvolvimento e consolidação.
Ao longo dos anos da sua existência a CESAP foi sendo uma estrutura leve,
eficiente e de custos muito reduzidos, com capacidade para dar resposta às suas
responsabilidades em relação às suas Escolas. Especialmente, em relação à
Escola Superior Artística do Porto, que sem dúvida alguma, durante décadas
prestou um serviço de qualidade na área da formação da arquitectura que lhe fez
ganhar uma dimensão para além das nossas fronteiras. Os nossos alunos sempre
foram bem acolhidos dentro e fora do país, em consequência do trabalho
realizado na nossa Escola.
Paradoxalmente, o Curso de Arquitectura lá foi sempre funcionando, onde
professores desenvolviam sem duvida alguma, um trabalho de grande dedicação ao
ensino, aos alunos, à formação no âmbito da arquitectura. Noventa por cento dos
docentes não tinha um vencimento de professor integral, porque a CESAP não
tinha e continua a não ter condições financeiras para integrar esses docentes e
dessa forma fazer face a todas as obrigações legais, subsidio de férias, segurança
social, etc...etc. Todavia, os docentes que também são cooperantes, davam o seu
melhor no ensino, na formação humana e profissional, custeando viagens e saídas
de campo, sem meios ou verbas para o efeito. Era uma comunidade, ou melhor uma
fraternidade de partilha entre alunos e professores, entre a Escola de
Arquitectura e o contexto nacional e internacional.
Aulas abertas, visitas de estudo, visitas a obras, seminários, conferencias,
congressos, mesas redondas, tudo se fazia a custo zero, sem grandes meios, mas
o importante era a amizade, o companheirismo entre todos, fossem alunos,
docentes e profissionais desta ou de outra área. Era um mundo aberto e plural.
Era assim a ESAP-Curso de Arquitectura.
Peço desculpa, se não me refiro aos outros cursos da ESAP, mas como
não conheço a sua realidade não me posso pronunciar.
Esta realidade não era um mar de rosas, também existiam divisões, conflitos,
outros interesses, que entre si partilhavam os cargos directivos. O Curso de
Arquitectura foi durante anos um corpo com coesão e com liderança forte;
contudo, a divisão e a fragmentação chegou ao curso da pior forma e no momento
menos apropriado. Em plena crise aparece a divisão, a fragmentação, a saída do
seu director carismático, e a diminuição de alunos que conduz à saída forçada
de colegas de longa data. Aparece a insatisfação, a duvida, a incerteza,
a desconfiança, a frustração de muitos colegas que durante décadas de serviço
dedicado à instituição são dispensados sem critério e sem fundamento.
Pela primeira vez, a ESAP no curso de Arquitectura perde diversidade científica
e técnica, e perde qualidade formativa, em beneficio da burocratização
académica que asfixia a criatividade, a diversidade de ensino, a qualidade
formativa. Numa Escola de pequena escala, onde a informalidade e a proximidade
faziam marca de diferenciação e de qualificação numa oferta cada vez mais standard
e redutora. A ESAP no Curso de Arquitectura marcava a diferença e afirmava
outro caminho na formação da arquitectura Europeia e Nacional. O Curso de
Arquitectura era sem dúvida uma oferta alternativa e de qualidade.
Com a saída do antigo director, com a burocratização académica, com a
uniformidade de curricula, com a destruição de cadeiras que faziam do nosso
curso uma alternativa de vanguarda, em relação às outras ofertas; transformamos
a diversidade e a singularidade no uniforme e no mesmo produto. Fomos copiar os
outros naquilo que eles tinham e têm de menos válido para a formação de um
arquitecto. Destruímos cadeiras e anexamos outras que colocam em causa a nossa
identidade e a nossa razão de ser....
No meio deste cenário de decisões caóticas e inoportunas, aparece também a
crise financeira, a escassez de liquidez, a incerteza de sustentabilidade na
ESAP /CESAP.
Esta crise não se explica só pelo contexto da crise financeira e social que
o país atravessa, mas também pela ausência de um programa estratégico de
sustentabilidade financeira por parte da CESAP, que não soube ou não teve
capacidade para o implementar. A direcção da CESAP deixou-se ultrapassar pelos
acontecimentos, perdeu a noção de oportunidade, fechou-se numa espécie de torre
de marfim quando se devia abrir à discussão como forma de arregimentar ideias,
vontades e sinergias criativas.
A CESAP, hoje, é uma instituição sem ideias, sem energia, sem plano e sem
estratégia capaz de resolver os problemas muito graves de financiamento que
afectam a ESAP.
A ESAP e os seus órgãos académicos também não estão ausentes de culpas neste
processo. Os órgãos académicos estão isolados da realidade, estão
burocratizados, atomizados e sem capacidade de reagir de forma a implementar as
medidas e as reformas necessárias. Durante mais de uma década com a absoluta
cobertura dos órgãos académicos abriram-se cursos sem alunos e sem
financiamento ajustado. Que consumiram milhares e milhares de euros.
A Direcção Académica e respectivos órgãos assistem à destruição da Escola
sem capacidade de reacção, sem implementar uma reforma profunda, sem uma
discussão eficaz e mobilizadora da sua comunidade escolar. A ESAP,
é um corpo vazio, triste, sem dinâmica, sem
sinergias, sem esperança. Entrar naquele edifício central dá uma sensação de angústia
e de frustração.
As salas vazias, os edifícios vazios, os professores sem alunos,
perante um aparelho burocrático tão complexo e em número tão elevado. Que
imagem tão paradoxal é esta. Para nossa frustração temos as esplanadas no largo
de S. Domingos cheias de turistas, mas onde param os nossos alunos. Os nossos alunos
que durante décadas deram vida e alma, ao largo, aos cafés e tascas; que se
sentavam nas soleiras e discutiam durante longas horas nas esquinas do Largo de
S. Domingos.
Onde param os nossos alunos?!...Que deram colorido às ruas com os seus
desenhos, os seus esquiços, com os seus olhares atentos a todo aquele
patrimonio que nos entra pelos pelos sentidos.
Nota: No próximo paper uma análise cuidada da realidade financeira da CESAP/ESAP
Porto e Guimarães.