terça-feira, 24 de julho de 2012

FILIAÇÃO, PARTICIPAÇÃO E CIDADANIA...

É comum quando se nasce numa pequena comunidade rural como é o Caso da Vila de Arouca, participarmos nas coisas da vida familiar ou da comunidade em geral. A nossa primeira iniciação é nos dada pelo baptismo, e pelo nome que nos legaram para sempre. Eu tive a sorte de ser baptizado na imponente Igreja monástica da Vila Monástica e Republicana de Arouca, e de ter um nome. O de Fernando dado pela minha madrinha e tia Fernanda de Almeida Matos Stoner-Jachson. A parteira que auxiliou ao parto da minha querida mãe, Beatriz de Almeida Matos foi a angelininha do convento, que com as suas mãos sábias e abençoadas pela providência e saber do Doutor Manuel Simôes Rodrigues, possibilitaram que as mães da Vila e arredores de Arouca tivessem os filhos em casa, no aconchego da familia e do lar. O nascer era uma epifania, um momento de revelação de vida e de graça. Eramos comunidade, partilhavamos esse pathos original, que era ser natural de uma terra. Ser de Arouca. Sim com muito orgulho.

Crescer, viver, brincar, jogar, trabalhar e estudar foi a nossa constante trajectória de vida. Partilhavamos a mesma Vila, as mesmas ruas, os mesmos logradouros, a mesma praça, o mesmo terreiro, a mesma identidade espacial que fazia de Arouca a nossa Terra. A minha Terra. Aprendemos as primeiras letras na Escola Primária de Arouca, com a preciosa ajuda da minha professora, que de vez enquando, era auxiliada por uma cana e umas reguadas que nos faziam sentir o peso da responsabilidade e a importância da escrita, da leitura e do calculo para a nossa formação. No recreio da escola a interação era total e dura às vezes. A classificação e a diferenciação social também lá estavam mas de forma sublimada. Eramos tão ingénuos, tão puros, que sentiamos a descriminação mas não compreendiamos a sua origem.

As tardes eram passadas entre a Escola e a Rua. As nossas casas davam para todas as casas da rua, esse oceano imenso de perfumes, de devaneios, de jogos, de brincadeiras, de partidas, de sonhos e utopias. Nós também sonhavamos com bonecos e brinquedos feitos de madeira, arame e barro. A quem davamos nomes sonantes e vida. Imaginavamos o mundo do tamanho da nossa Vila. A nossa Vila é o mundo inteiro e mais a serra da Freita. Esse espaço de interdito e de aventura. Um pedaço de terra e água, de luz e muito sol, de bichos e lacraus, de homens e mulheres, tapados desde a cabeça aos pés, de preto e as crianças muito brancas e de um loiro brilhante como o trigo. Uns cantares que vinham de dentro da alma e nos deixavam o corpo com pele de galinha. Eram vozes de outro mundo, de outro imaginário, antigas, belas e harmoniosas. Estranhas vozes eram aquelas que ao fim das cerimónias religiosas entoavam canticos e rezas. 


As festas, os jogos, as cerimónias eram espaços de participação onde todos os jovens exprimiam as suas vocações, os seus imaginários e eram sobretudo momentos de celabração colectiva. Parentes, amigos e vizinhos participavam como actores privilegiados. A Festa de S. Bartolomeu e acima de tudo a Feira das Colheitas eram momentos de consagração ao ludico e ao festivo. As ruas enchiam-se de gentes, de vendedores e forasteiros, de cores e musica, de entretenimento e jogo para os lados do Parque da Vila. A Praça Brandão Vasconcelos encia-se de bandas e figurinos, de floclore e concertinas, de cantares ao desafio e cramois. Homens de preto com chapeus solenes, mulheres de véu e cartilha a caminho do sagrado. Sem esquecer as tarde e as longas sessões da noite no Cinema de Arouca. A quem presto na pessoa do Senhor Valdemar Duarte a minha sincera homenagem. As visitas que faziamos à Defesa de Arouca para apanhar uns papelinhos de cores diferentes que o amigo Gonçalves ia dando à pequenada. Ficavamos a olhar para aquela máquina rotativa a imprimir noticias, nomes conhecidos e figuras de Arouca. Era um reino maravilhoso. Ver nascer a comunicação e a informação. Mais tarde tivemos o privilégio de aí publicar os primeiros artigos sobre a história local.

As tardes de estudo e de leitura na Biblioteca da Gulbenkian em frente à Praça de Arouca foram o primeiro contacto com a cultura, a arte e a ciencia. Na companhia dos amigos e parentes. Entrar naquela sala cheia de estantes e livros, era como entrar no Mundo Inteiro. A Luizinha Alegria sempre disponivel e meiga, lá nos mostrava as novidades da literatura, da musica e do teatro. Falava-nos de Eunice a rainha da arte de representar. Era local de encontro e de namoro também. Ainda lembro quando a minha irmã me inscreveu na biblioteca e tive direito a um cartão. Que alegria ter um cartão com o meu nome. Hoje, é coisa banal e insignificante. Estamos cheios de cartões, oferecem-nos cartões por tudo e nada.

Mais tarde, com o 25 de Abril nasce a consciência politica e a cidadania inclusiva. É o tempo das revoluções, das manifestações, das greves às aulas, das lutas políticas que entravam pela Escola Preparatória e Secundária de Arouca. Professores militantes e activistas, alunos de cabelos compridos e intelectualizados, palavras que se diziam na rua, sem nexo e sem sentido. Todos na praça e na rua, noite dentro e linguas afiadas. A discussão e a partilha eram a regra e a excepção. Falava-se pouco de politica, mas discutia-se muito a liberdade, a democracia, e por oposição o fascismo e o salazarismo. Recordo a grande ovação no autocarro que partia da vila em direcção a Santa Eulália, com os alunos da vila, e o Toni dispara: MORREU O FRANCO. VIVA A LIBERDADE! Todos em unissono gritaram morte ao Franco e vivas à liberdade. Ninguém sabia quem era o Franco. Mas era o perfume da liberdade, da participaçao e da democracia. Os cravos ainda estavão a abrir, a despertar, e apontavam para um futuro de esperança.

Pela primeira vez a nossa comunidade dividiu-se em duas partes distintas. Com pais e filhos em lados opostos, divididos pela razão e crença na liberdade e na democracia popular. De um lado os progressistas, revolucionários e democratas; do outro, fascistas e salazarentos. Eram tempos de consagração e de celebração, mas também eram os tempos dos ismos, dos esquerdismos, dos radicalismos ideológicos. A vida social parecia uma pelicula de cinema a preto e branco, não existiam outras vias e outras cores. Esta realidade politica empobreceu a sociedade e diabolizou tudo e todos que não tivessem um passado comunista e revolucionário. Na nossa sociedade também se fizeram autos de fé, poucos mas fizeram-se. Listas com nomes, com gente boa e gente má.  Filhos que abandonaram a casa, a familia e os parentes. Pais que envergonhados calavam as mágoas no altar da Rainha Santa e rogavam por milagre. O direito, a autoridade e a mão de Deus foi deslocada da sua centralidade social. O mundo tinha mudado de forma tão veloz que não dava possibilidade de objectivar fosse o que fosse. Andavamos todos na onda. Cabelos compridos, calças de ganga, gabardines compridas, discos de Jim Morrison, o Roch na algibeira, a coca-cola, e os UHF...e a crença no sexo e na liberalidade dos costumes.

Com a década de oitenta e noventa reforça-se o associativismo cultural e ambiental. A causa ecológica e a defesa do ambiente começam a fazer parte do nosso imaginário social e entram na nossa cidadania activa. Fundamos associações e movimentos locais e regionais. Organizaram-se encontros e jornadas em prol da defesa do património e do ambiente. A luta contra a plantação dos eucaliptos em Arouca e na bacia do rio Paiva com a colaboração da QUERCUS, na pessoa do seu fundador Serafim Riem. Anos de encontros de Movimentos Ambientalistas em Arouca, Paiva, Porto, Lisboa, Aveiro, Coimbra, Viseu, etc.etc. Nasce a preocupação de participar activamente na vida publica, aparecem os partidos politicos e as filiações. Uma geração inteira e nova que acredita que o sonho comanda a vida.

É neste contexto de vida e de cidadania que me sinto mandatado a disponibilizar-me para ser candidato a Presidente de Câmara de Arouca: em nome do passado, da memória e acima de tudo pela construção de um FUTURO MELHOR PARA AROUCA.

8 comentários:

Anónimo disse...

Arouca é sem dúvida uma terra lindíssima.
É também por mérito próprio o solar da Raça Bovina Arouquesa, uma espécie animal autóctone que corre sérios riscos a medio prazo ser extinta.

Gomes

Baião

Fernando Matos Rodrigues disse...

Boa tarde Amigo Gomes, Tem toda a razão quando diz que Arouca é o solar da raça arouquesa, lamento que nada ou muito pouco se tenha feito por este património genético de valor cultural e económico único na nossa região. Infelizmente, como o amigo Gomes muito bem sabe, a raça arouquesa serve única e exclusivamente para os meomentos festivos e concursos locais. O dinheiro inutil que se gasta em apagar os fogos, fosse distribuido pelos criadores de gado arouqês deixavamos de ter incendios na serra e aumentavamos a economia local. Mas infelizmente, este gado autótene não dá para meter na algibeira de alguns corruptos os euros a que eles estão habituados. Por isso matamos a economia de montanaha e encerramos as casas florestais. Abraço amigo

Anónimo disse...

Amigo Sr. Professor,
Concordo com algum conteúdo do seu comentário. Mas devo- lhe dizer que foram feitas várias propostas ao longo dos anos pelos Deputados do PCP na Assembleia da República para a criação e preservação desta valiosíssima espécie animal, propostas essas que foram sistematicamente rejeitas pelos outros partidos com assento parlamentar.
A Raça Bovina Arouquesa para além de produzir uma carne de qualidade impar como o afirmou várias vezes o prestigiado médico veterinário e especialista nesta espécie animal Dr. Sanches Magalhães, estes animais tem outra vertente de grande valor cultural que está associada ao trabalho violentíssimo que desenvolvem na faina agrícola.
Receba do amigo sincero um abraço muito caloroso.
Gomes
Baião

Fernando Matos Rodrigues disse...

Boa noite amigo Senhor Gomes,
Espero que por Baião esteja tudo bem e com a familia também. Quando vier ao Porto não deixe de aparecer para falarmos um pouco. Claro que o PCP tem nessa matéria feito recomendações e trabalho válido, pena é , que no nosso país, a ideologia e as diferenças partidárias pouco ou nada contribuem para o Bem Nacional.
Abraço amigo
FMR

Anónimo disse...

Amigo Sr. Professor,
Está combinado, quando eu tencionar deslocar – me à cidade do Porto eu telefonar – lhe – ei para nos encontrarmos num dos cafés da Invicta e falarmos um pouco pessoalmente.
Voltando novamente à questão desse valiosíssimo património genético e cultural que é a Raça Bovina Arouquesa devo acrescentar o seguinte:
Quando da discussão do Orçamento Geral do Estado para os anos 90 até 2011, foram apresentadas várias dotações orçamentais a incluir em PIDDAC pelos parlamentares do PCP para a criação de centros de requeria de novilhas deste espécie animal a implementar um em Baião, outro em Cinfães e outro em São Pedro do Sul.
A criação destes centros entre outros objetivos tinha como função fazer investigação científica no apuramento desta raça autóctone, maior controle sanitário, e a sua reprodução para evitar o que infelizmente poderá vir acontecer nas próximas décadas, a sua extinção.
Pelo consigo observar nos concursos pecuários desta espécie animal que se vão realizando aqui em Baião, uma boa parte dos animais apresentados em tais eventos são provenientes dos Concelhos de Arouca e Cinfães, uma vez que em Baião e digo – o com grande tristeza e muita amargura já aparecem muitos poucos exemplares.
Tenho conversado com alguns criadores do Concelho de Arouca que conhecem o Sr. e a sua família.
Devo referir, que há cerca de três anos quando me encontrava em plena Serra da Aboboreira a fotografar uma novilha desta espécie animal apareceu lá um Sr. com um camião da ANCRA que me pediu para lhe indicar o caminho com destino a Aldeia Velha do Concelho de Amarante. Depois de lhe indicar o trajeto que deveria fazer para chegar ao seu destino, este disse-me o seguinte:
Tire, fotos a estes belíssimos animais, porque daqui a muito poucos anos já não as vai puder tirar, porque este gado está a desaparecer de forma vertiginosa!

Abraço amigo!
Gomes

Anónimo disse...

Amigo Sr. Professor,
Está combinado, quando eu tencionar deslocar – me à Cidade do Porto eu telefonar – lhe – ei para nos encontrarmos num dos cafés da Invicta e falarmos um pouco pessoalmente.
Voltando novamente à questão desse valiosíssimo património genético e cultural que é a Raça Bovina Arouquesa devo acrescentar o seguinte:
Quando da discussão do Orçamento Geral do Estado para os anos 90 até 2011, foram apresentadas várias dotações orçamentais a incluir em PIDDAC pelos parlamentares do PCP para a criação de centros de requeria de novilhas deste espécie animal a implementar um em Baião, outro em Cinfães e outro em São Pedro do Sul.
A criação destes centros entre outros objetivos tinha como função fazer investigação científica no apuramento desta raça autóctone, maior controle sanitário, e a sua reprodução para evitar o que infelizmente poderá vir acontecer nas próximas décadas, a sua extinção.
Pelo consigo observar nos concursos pecuários desta espécie animal que se vão realizando aqui em Baião, uma boa parte dos animais apresentados em tais eventos são provenientes dos Concelhos de Arouca e Cinfães, uma vez que em Baião e digo – o com grande tristeza e muita amargura já aparecem muitos poucos exemplares.
Tenho conversado com alguns criadores do Concelho de Arouca que conhecem o Sr. e a sua família.
Devo referir, que há cerca de três anos quando me encontrava em plena Serra da Aboboreira a fotografar uma novilha desta espécie animal apareceu lá um Sr. com um camião da ANCRA que me pediu para lhe indicar o caminho com destino a Aldeia Velha do Concelho de Amarante. Depois de lhe indicar o trajeto que deveria fazer para chegar ao seu destino, este disse-me o seguinte:
Tire, fotos a estes belíssimos animais, porque daqui a muito poucos anos já não as vai puder tirar, porque este gado está a desaparecer de forma vertiginosa!

Abraço amigo!
Gomes

Fernando Matos Rodrigues disse...

Sem duvida amigo Gomes. Precisamos falar sobre tanta coisa. O nosso país e a europa caminham a passo acelerado para a desgraça económica e social.Uma europa que segunda dados da OCDE a pobreza em 2010 rondava já 79 milhões de cidadãos europeus. Um aumento significativo das assimetrias sociais em matéria de distribuição de rendimentos. Mas que projecto europeu é este???? meu caro amigo sempre fizemos um exercicio de cidadania critica e ativa contra esta situação...mas a politica é cega, e os governantes estão cegos pela corrupção e mediocridade. abraço amigo

Anónimo disse...

Caro amigo Sr. Professor,
Sem abdicar dos princípios e convicções que defendo acerrimamente, não tenho qualquer complexo em falar seja com quem for e de temas que eu tenha conhecimento porque nunca fui sectário.
Quanto à questão política nacional e internacional, os caminhos que os governantes têm trilhado e continuam a trilhar são altamente perigosos, pondo mesmo em causa a própria sobrevivência humana.
Conta aquilo que alguns dos nossos políticos nacionais e seus comentadores de serviço têm vindo a afirmar ao longo dos anos, cava vez está mais claro que a Comunidade Europeia e o €uro têm os dias contados, é na minha prespectiva uma questão de tempo.
As consequências de tal desagregação na minha modesta opinião vai trazer consequências terríveis para toda a Europa e como é óbvio para o nosso País, uma vez que o nosso aparelho produtivo está a ficar completamente destruído, embora o governo, os escrivas e comentadores de serviço continuem a negar esta dura realidade.
Quanto ao Concelho de Baião, por várias vezes afirmei publicamente e novamente volto a afirmar:
Se a propaganda e o folclore político resolvessem os gravíssimos problemas do povo desta lindíssima terra, não tenhamos a menor dúvida que o município baionense era sem dúvida o mais desenvolvido dos 18 concelhos que constituem o distrito do Porto.
Abraço amigo
Gomes